A importante questão sobre a cobertura de procedimentos médicos pelos planos de saúde, especialmente quando se trata de tratamentos complexos como o implante duplo de stent, envolve não apenas direitos fundamentais dos beneficiários, mas também uma análise detalhada da legislação aplicável e das decisões judiciais dos tribunais superiores brasileiros. Neste ponto, vamos explorar, sem colocar fim ao debate, o dever das operadoras de planos de saúde em custear o implante duplo de stent, destacando os aspectos legais e jurisprudenciais pertinentes.
A Lei nº 9.656/1998 é a principal norma que regula os planos e seguros privados de assistência à saúde no Brasil. A referida Lei estabelece que são obrigatórias a cobertura e a prestação de serviços relacionados à promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo procedimentos médicos necessários, como o implante de stent, desde que estejam previstos no rol de procedimentos da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).

A ANS é responsável por definir o rol de procedimentos e eventos em saúde que devem ser obrigatoriamente cobertos pelos planos de saúde, conforme as diretrizes estabelecidas pela Resolução Normativa nº 465/2021. O implante de stent está incluído nesse rol, o que reforça a obrigação das operadoras em oferecer cobertura para esse tipo de procedimento quando necessário ao tratamento do paciente.
•A Lei 9.656/98, que regulamenta os planos de saúde, estabeleceu a obrigatoriedade de prestação de serviços integrais ao tratamento de doenças por parte das operadoras de saúde.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), na súmula 93, definiu que a implantação de stent é um ato inerente à cirurgia cardíaca/vascular, sendo abusiva a negativa de sua cobertura, ainda que o contrato seja anterior à Lei 9.656/98.
Já a Súmula 102 do TJSP destaca que, “havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.”
O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento sobre as relações consumeristas entre o plano de saúde e o segurado a partir da Súmula 608: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.
O mesmo STJ, no Recurso Especial n.º 668216-SP, destacou que “… se o plano está destinado a cobrir despesas relativas ao tratamento, o que o contrato pode dispor é sobre as patologias cobertas, não sobre o tipo de tratamento para cada patologia alcançada pelo contrato. Na verdade, se não fosse assim, estar-se-ia autorizando que a empresa se substituísse aos médicos na escolha da terapia adequada de acordo com o plano de cobertura do paciente”.

Como exemplo, a cobertura de implantes de stent é crucial para pacientes com doenças cardiovasculares graves, garantindo acesso a tratamentos que podem salvar vidas. Os direitos dos consumidores são protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990), que veda práticas abusivas e estabelece a obrigação das operadoras de planos de saúde em garantir a assistência necessária conforme prescrição médica.
Isso quer dizer que o plano de saúde pode estabelecer que doenças estão sendo cobertas, mas não que o tipo de tratamento está alcançado para a respectiva cura. Assim, por exemplo, se está coberta a cirurgia cardíaca, não é possível vedar a utilização de stent, ou, ainda, se está coberta a cirurgia de próstata, não é possível impedir a utilização de esfíncter artificial para controle da micção. O mesmo se diga com relação ao câncer. Se a patologia está coberta, nos parece inviável vedar a quimioterapia pelo simples fato de que a quimioterapia é uma das alternativas possíveis para a cura da doença. Nesse sentido, a nosso juízo, a abusividade da cláusula reside exatamente nesse preciso aspecto, qual seja, não poder o paciente, consumidor do plano de saúde, ser impedido de receber tratamento com o método mais moderno do momento em que instalada a doença coberta em razão de cláusula limitativa. É preciso ficar bem claro que o médico, e não o plano de saúde, é responsável pela orientação terapêutica. Entender de modo diverso põe em risco a vida do consumidor.
Para garantir a cobertura do implante de stent, é recomendável que o beneficiário tenha em mãos a prescrição médica detalhada, documentos que comprovem a urgência ou necessidade do procedimento, e busque orientação jurídica especializada caso haja recusa injustificada por parte da operadora de plano de saúde.
Em suma, o dever dos planos de saúde em cobrir e custear o implante duplo de stent está respaldado pela legislação brasileira e pela jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores. É essencial que as operadoras cumpram suas obrigações legais e éticas, garantindo que os beneficiários tenham acesso aos tratamentos necessários para preservação de sua saúde e qualidade de vida.
Portanto, cabe aos consumidores, advogados especializados e órgãos reguladores assegurar o cumprimento dos direitos dos pacientes e combater práticas que possam comprometer o acesso à saúde digna e adequada no sistema privado de saúde no Brasil.
