Azevedo e Lourenco Advogados

A Possibilidade de Concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS) a Crianças Portadoras de TDAH

O Benefício de Prestação Continuada (BPC), previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), é um direito constitucionalmente assegurado a pessoas com deficiência e idosos de baixa renda, desde que cumpridos determinados requisitos. Quando se trata de crianças portadoras de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), a análise para a concessão do benefício deve ser criteriosa, levando em conta as limitações funcionais que o transtorno pode causar e seu impacto na vida da criança. Este artigo aborda a possibilidade de concessão do BPC para crianças com TDAH, começando pela conceituação do transtorno e suas implicações, até a análise dos critérios jurídicos para o recebimento do benefício.

O que é o TDAH?

Em linhas gerais, podemos definir o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) como sendo um transtorno neurobiológico crônico, geralmente diagnosticado na infância e que pode persistir na fase adulta. O TDAH caracteriza-se por três sintomas principais: desatenção, hiperatividade e impulsividade. Essas características podem manifestar-se de maneira diferente em cada indivíduo, sendo classificadas em três tipos:

– TDAH predominantemente desatento: a criança apresenta dificuldade em manter a atenção, é facilmente distraída, esquece tarefas e parece não ouvir quando é falada diretamente.

– TDAH predominantemente hiperativo/impulsivo: a criança apresenta um nível elevado de atividade motora, dificuldade em permanecer sentada ou quieta, fala em excesso e tende a agir sem pensar nas consequências.

– TDAH combinado: é o tipo mais comum e apresenta tanto características de desatenção quanto de hiperatividade e impulsividade.

Embora muitas crianças possam, em algum momento, apresentar comportamento desatento ou agitado, no TDAH, esses comportamentos ocorrem de forma persistente e afetam negativamente o desempenho escolar, as interações sociais e a vida familiar da criança.

Dificuldades Enfrentadas pelas Crianças com TDAH

As crianças portadoras de TDAH enfrentam uma série de desafios em seu dia a dia. O transtorno não afeta apenas o desempenho acadêmico, mas também a capacidade de estabelecer relações sociais e cumprir tarefas cotidianas. Algumas das principais dificuldades incluem:

– Dificuldade de concentração: Crianças com TDAH desatento frequentemente têm dificuldade em concluir tarefas escolares e podem precisar de suporte educacional extra.

– Problemas de comportamento: Crianças com o subtipo hiperativo/impulsivo muitas vezes são vistas como desobedientes ou desrespeitosas, uma vez que têm dificuldade em controlar impulsos.

– Prejuízos sociais: A impulsividade e a hiperatividade podem prejudicar as relações com colegas, levando ao isolamento social ou à exclusão em atividades de grupo.

– Baixa autoestima: Devido às constantes críticas e à percepção de falhas em atividades escolares e sociais, essas crianças podem desenvolver baixa autoestima, o que impacta sua saúde mental.

Essas dificuldades, quando associadas a um ambiente de vulnerabilidade social e econômica, podem gerar graves consequências para o desenvolvimento da criança, o que justifica a busca por auxílio por meio de benefícios sociais.

O Benefício de Prestação Continuada (BPC) e sua Finalidade

O Benefício de Prestação Continuada (BPC), regulado pela Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS), é destinado a garantir o sustento de pessoas em situação de vulnerabilidade que não possuem meios de prover sua subsistência. O BPC é pago no valor de um salário mínimo mensal e pode ser concedido tanto a idosos com 65 anos ou mais quanto a pessoas com deficiência de qualquer idade, desde que atendam aos requisitos legais.

No caso de crianças, o critério central é a presença de deficiência, que a Lei define como a limitação de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial que impeça a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (art. 20, §2º, da Lei nº 8.742/93). Além disso, a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼ do salário mínimo.

TDAH como Deficiência para Fins de BPC

Embora o TDAH não seja, por si só, considerado uma deficiência física ou mental de forma automática, ele pode ser entendido como uma deficiência quando resulta em limitações significativas na vida da criança, afetando seu desenvolvimento e impedindo-a de participar plenamente da sociedade.

A “deficiência” avaliada para fins de concessão do BPC não se limita à existência de um laudo médico diagnosticando o transtorno, mas sim à análise de como o TDAH impacta a capacidade da criança de realizar atividades cotidianas e se ela está em situação de vulnerabilidade social e econômica. Ou seja, a análise da deficiência deve considerar as barreiras enfrentadas pela criança no ambiente escolar, social e familiar.

Para que uma criança portadora de TDAH seja elegível ao BPC, deve-se demonstrar que o transtorno resulta em severas limitações funcionais que a impedem de realizar as atividades esperadas para a sua idade, como a aprendizagem adequada, a interação social harmoniosa e a independência em tarefas cotidianas. Essas limitações podem ser agravadas quando a família não tem condições financeiras de prover o tratamento adequado, como acompanhamento psicopedagógico, terapias e medicação.

Critérios para a Concessão do BPC

Para a concessão do BPC à criança portadora de TDAH, é necessário o cumprimento de dois requisitos principais:

1. Comprovação da Deficiência: A deficiência precisa ser comprovada por meio de laudos médicos e exames que indiquem como o TDAH impacta a vida da criança. A análise será feita por uma perícia médica do INSS, que verificará as limitações e como essas afetam sua funcionalidade.

2. Baixa Renda: A família da criança deve comprovar que a renda familiar per capita é inferior a ¼ do salário mínimo. Esse requisito é fundamental, já que o BPC é um benefício assistencial voltado a famílias em situação de extrema vulnerabilidade.

A Importância do Tratamento Adequado

É importante ressaltar que o tratamento do TDAH envolve acompanhamento médico especializado, terapia comportamental e, em muitos casos, medicação. Crianças que não recebem o suporte adequado podem ver seus sintomas agravados, o que reforça a necessidade de apoio financeiro para o custeio de tratamentos.

O BPC, portanto, pode ser uma ferramenta importante para garantir que a criança com TDAH tenha acesso aos tratamentos de que necessita, desde que cumpridos os requisitos legais.

Jurisprudência e Entendimento dos Tribunais

A concessão do BPC para crianças com TDAH ainda é um tema que gera debates no âmbito judicial. Embora não haja um entendimento pacífico sobre o assunto, alguns tribunais têm reconhecido que o transtorno pode, em certos casos, configurar uma deficiência para fins de concessão do benefício. A chave para essas decisões é a análise da extensão das limitações impostas pelo TDAH e o impacto que elas causam na vida da criança.

Por exemplo, em algumas decisões, o Judiciário tem considerado que, quando o TDAH impede a criança de participar de atividades escolares e sociais em igualdade de condições com outras crianças, e a família está em situação de vulnerabilidade econômica, é possível enquadrar o transtorno como uma deficiência para fins de concessão do BPC.

Por fim, a possibilidade de concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) a crianças portadoras de TDAH deve ser analisada com base nas particularidades do caso concreto. O TDAH, por si só, não configura uma deficiência automática para a obtenção do benefício, mas, quando associado a severas limitações funcionais e sociais, pode ser considerado como tal. Além disso, é fundamental que a renda familiar per capita seja inferior ao limite legal.

O reconhecimento do direito ao BPC pode ser um importante passo para garantir que a criança com TDAH receba o tratamento adequado e tenha suas necessidades assistenciais atendidas, promovendo seu bem-estar e desenvolvimento pleno.

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