Azevedo e Lourenco Advogados

A Aplicação da Teoria do Desvio Produtivo em Casos de Envio de Boletos Falsos e Inércia da Empresa

A prática de envio de boletos falsos é uma fraude que tem se tornado cada vez mais comum, causando prejuízos significativos aos consumidores. Quando a empresa, além de falhar na prevenção dessa fraude, se mantém inerte na resolução do problema, surge a possibilidade de aplicação da Teoria do Desvio Produtivo para garantir a devida reparação ao consumidor. Essa teoria, desenvolvida pelo Dr. Marcos Dessaune, considera o tempo desperdiçado pelo consumidor na tentativa de solucionar problemas causados pela má prestação de serviços como um dano indenizável.

A base legal para a aplicação da Teoria do Desvio Produtivo em casos de envio de boletos falsos e inércia da empresa na resolução do problema pode ser encontrada no Código de Defesa do Consumidor (CDC), Lei nº 8.078/1990, especialmente nos seguintes dispositivos:

– Art. 6º, VI: “São direitos básicos do consumidor: a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos.
– Art. 14: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I – o modo de seu fornecimento; II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi fornecido.

Além disso, o próprio Código Civil, prescreve:
– Art. 927. “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”

Nesta quadra, conjugando a Teoria do Desvio Produtivo e os artigos acima mencionados, podemos afirmar que: “A perda do tempo útil não é apenas uma sensação desagradável ou um mero dissabor, mas um dano real, que afeta o patrimônio imaterial do consumidor e deve ser reparado. O desvio produtivo do consumidor representa uma violação à dignidade da pessoa humana e ao direito fundamental à qualidade de vida.”

Atendo a esta questão, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) tem se posicionado de forma favorável ao reconhecimento da Teoria do Desvio Produtivo em situações envolvendo envio de boletos falsos e inércia das empresas, conforme vemos abaixo:

Contrato bancário. prestação de serviço. Ação de indenização por danos materiais e morais. Falha na prestação de serviços. Autora que foi vítima do ‘golpe do boleto. Responsabilidade objetiva. Fortuito interno. Sentença de improcedência. Reforma. Trata-se da fraude conhecida como golpe do boleto e que, no caso concreto, só foi possível pelo uso de ferramentas disponibilizadas pelo réu. As provas asseguram que a fraude foi perpetrada quando a autora, após acesso ao site do réu atendimento – fale conosco, foi direcionada ao aplicativo “Whatsapp”, cuja atendente, portadora de dados relacionados às partes, enviou-lhe boleto falso para quitação de financiamento. Nesse panorama, o réu deve responder pelos danos decorrentes do serviço deficiente, pela falta da segurança legitimamente esperada pelo consumidor. As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias (Súmula 479 do STJ). Danos morais. Configuração. A exigência de prova do dano moral, no caso concreto, se satisfaz com a comprovação do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. E tais sentimentos são inegáveis, uma vez que a autora possui presumida boa-fé e foi ludibriada por terceiros, despendendo esforços para tentar solucionar o problema que estava enfrentando.

A fim de atender aos anseios reparatório e punitivo, e ao caráter profilático e pedagógico da medida, fixa-se a indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Apelação provida. (TJSP; Apelação Cível 1026871-63.2022.8.26.0007; Relator Sandra Galhardo Esteves; Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional VII – Itaquera – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 24/05/2024; Data de Registro: 24/05/2024).


Nesse mesmo sentido:
Apelação Ação indenizatória Pagamento realizado mediante boleto falso Demanda proposta contra a instituição financeira em nome de quem foi emitido o boleto. Sentença de acolhimento parcial dos pedidos. Irresignação, do banco réu, improcedente. 1. Hipótese dos autos em que está positivado o vazamento de informações sob a guarda do banco credor, que possibilitou a confecção do boleto fraudado pelo terceiro. Responsabilidade inequívoca (art. 14, §1º, do CDC e art. 927, parágrafo único, do CC). 2. Danos morais sem sombra de dúvidas verificados, haja vista que o autor, homem simples e de poucos recursos, se viu privado de quantia para ele considerável, além de ter percorrido longo caminho para tentar solucionar a questão. Indenização a esse título arbitrada em primeiro grau, no valor de R$ 5.000,00, não comportando a pretendida redução. 3. Juros de mora devidos da data da citação, por se tratar de responsabilidade contratual. 4. Honorários de sucumbência arbitrados em plena consonância com a regra do art. 85, §2º, do CPC e não comportando a pretendida redução. 5. Sentença mantida. Negaram provimento à apelação. (TJSP; Apelação Cível 1004866-87.2022.8.26.0220; Relator Ricardo Pessoa de Mello Belli; Órgão Julgador: 19ª Câmara de Direito Privado; Foro de Guaratinguetá -†3ª Vara; Data do Julgamento: 27/05/2024; Data de Registro: 27/05/2024)

Diante de tais fatos, a aplicação da Teoria do Desvio Produtivo em casos de envio de boletos falsos e inércia da empresa na (re)solução do problema é uma medida justa e necessária para garantir a proteção dos direitos dos consumidores. A legislação aplicável e a doutrina especializada fornecem bases sólidas para essa aplicação, enquanto a jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo reafirma a importância de se indenizar o consumidor pelo tempo perdido e pelo sofrimento causado. Dessa forma, essa teoria se mostra essencial na busca por uma reparação integral dos danos sofridos pelo consumidor.

Caso tenha enfrentado questão semelhante e queira saber quais são seus direitos, pode nos contatar através de nossos canais de atendimento.

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